terça-feira, janeiro 20, 2009

para quem estiver no Rio: um espetáculo imperdível, com direção musical do meu amigo Roberto Gnatalli

'O bilontra': famoso espetáculo de revista de Arthur Azevedo estreia na terça, no Solar de Botafogo

Publicada em 12/01/2009 às 10h38m

RIO - Arthur Azevedo deu azar.

- Foi morrer no mesmo ano que Machado de Assis - brinca o diretor José Henrique, ao tentar explicar por que o centenário de morte de Azevedo, ano passado, foi eclipsado pelo de Machado.

Partiu de José Henrique e de seu Teatro na Justiça, projeto de apresentações no Centro Cultural Emerj, que está completando dez anos, a única homenagem mais substanciosa aos cem anos de morte do dramaturgo em 2008: um ciclo de leituras de textos de Arthur Azevedo. Agora, um desses textos virou montagem para valer - "O bilontra", que estréia na terça-feira (13-01) no Teatro Solar de Botafogo.

Com adaptação e direção do próprio José Henrique, "O bilontra" foi o primeiro espetáculo de revista de maior sucesso de Azevedo (que o escreveu com colaboração de Moreira Sampaio). Apresentado pela primeira vez em 1886, abriu caminho para a carreira de êxito que o teatro de revista teria no país - êxito tamanho que, mais tarde, o gênero acabaria sendo confundido com outro gênero bastante popular, o teatro musicado das vedetes. O teatro de revista original, no entanto, significava espetáculos que, como o nome dizia, faziam uma revisão, uma retrospectiva dos fatos mais marcantes do ano anterior.

- Com humor e números musicais. Havia um fato do ano que funcionava como historinha central e que era intercalada pelos outros acontecimentos - acrescenta José Henrique.

'Rondó do pré-sal' é um dos números da peça

No caso de "O bilontra", a história-eixo foi um caso famoso de estelionato ("bilontra" quer dizer algo como "espertalhão") na época de Arthur Azevedo: um comerciante comprou um título falso de barão e, em festa que comemorava a compra, descobre que tinha sido enganado.

- Na leitura no Centro Cultural Emerj apenas seguimos o texto original, mas, para a montagem, como íamos estrear no começo de 2009, pensei em fazer uma retrospectiva de 2008, juntando os fatos de agora com aqueles do texto, que revisitavam 1885 - destaca José Henrique, que no cenário da peça se vale de projeções de fotos de época.

Foi assim que nasceu, por exemplo, o "rondó do pré-sal", um dos fatos de 2008 que entraram na revisão feita pelo espetáculo. No rondó, o diretor ironiza o fato de as reservas de petróleo do pré-sal terem virado "a salvação da economia brasileira" antes mesmo de serem extraídas.

O incidente do jogador Ronaldinho com os travestis também entrou na roda.

- Esse episódio, nós incluímos na parte em que o texto fala da polícia noturna que havia na época, que ia atrás dos capoeiristas. O personagem Fenômeno vai a essa polícia prestar queixa do golpe que sofreu - conta o diretor sobre a montagem, que fala ainda da eleição de Barack Obama como presidente americano (ao tratar da abolição da escravidão) e da Cidade da Música (quando um personagem pergunta se ela ficaria perto do Palácio dos Teatros, ouve como resposta: "Não, é muito longe daqui, e só vai ficar pronta daqui a cem anos").

Assim como o teatro de revista original fazia com o cenário teatral do ano anterior, a montagem também passa em revista o panorama teatral do Rio em 2008. E, aí, qualquer semelhança com fatos atuais é mera coincidência:

- Na obra, Arthur Azevedo reclama da diminuição das peças de qualidade, como as óperas, operetas e tragédias, porque os teatros só estariam interessados em fazer "recreio dramático" para o povão. Pois é... Resolvemos inventar a dupla de produtores de musicais "Charles e Clau", que faz uma paródia nacionalista para canções do musical "A noviça rebelde".

Descompasso entre literatura e dramaturgia

As canções da montagem de "O bilontra" têm letras originais e também letras do texto original, que foram musicadas por Luiz Antonio Barcos, Gomes Cardim e Roberto Gnatalli, este o diretor musical do espetáculo. Muitas partituras originais se perderam, diz o diretor José Henrique, lamentando o esquecimento em que teria caído a obra de Arthur Azevedo.

- As peças curtas dele são mais montadas em escolas e cursos de artes cênicas. Já as obras mais longas, nem lá nem no circuito comercial: ou podem ter ficado datadas, caso das revistas, ou precisam de elenco grande e por isso têm montagem cara, caso das revistas e das operetas. Mas Arthur Azevedo, para mim, foi o maior homem de teatro brasileiro. Foi dramaturgo, agitador cultural da sua época, pensador das artes - completa o diretor. - Badalaram tanto o Machado de Assis em 2008 não porque as pessoas leem muito Machado, não. Boa parte só lê na escola. Mas, como na escola ninguém lê dramaturgia brasileira, ninguém a conhece direito. No Brasil, a literatura deixou de fora a dramaturgia.

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